Sob pressão internacional, Salles anuncia recriação da Secretaria do Clima
- majutavares
- 13 de ago. de 2020
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O governo federal anunciou esta quarta-feira uma reestruturação do Ministério do Meio Ambiente (MMA), em meio a protestos ligados ao avanço do desmatamento e ao provável descumprimento de metas relacionadas ao corte da emissão de gases de efeito estufa.
Pressionado por ONGs, bancos e fundos de investimento, o MMA criou a Secretaria de Amazônia e a recriação de uma que responderá por Clima e Relações Internacionais. A secretaria dedicada a este tema foi extinta em um decreto assinado no dia 2 de janeiro de 2019.
Outro destaque é a criação da Secretaria de Áreas Protegidas, que terá, entre suas funções, definir estratégias para programas que serão implementados pelas unidades de conservação. Estes territórios já são geridos por uma autarquia do MMA, o Instituto Chico Mendes para Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
As mudanças foram publicadas na edição desta quarta-feira do Diário Oficial da União e entrarão em vigor no dia 21 de setembro. O ministério não divulgou quais serão seus programas prioritários e os titulares das secretarias. Em nota, o MMA afirmou que as mudanças trarão mais “transparência, agilidade e eficiência na gestão ambiental”, achatando a pirâmide estrutural do ministério e aproximando dirigentes dos servidores.
A Associação dos Servidores do Ministério do Meio Ambiente (Assemma) divulgou comunicado e, depois, uma carta aberta ao ministro Ricardo Salles, criticando a reestruturação feita "a portas fechadas", sem envolvimento de servidores da pista mais capacitados na área.
Os servidores destacam que a reestruturação do ministério ignorou temas como gestão de recursos hídricos e de povos indígenas. Além disso, segundo a Assemma, o foco da Secretaria da Amazônia também não estaria claro. Ela também seria responsável pela reforma e uso sustentável dos outros biomas do país, que sequer são mencionados no decreto — entre eles, a Mata Atlântica, onde vive 70% da população brasileira, e o Pantanal, onde o número de incêndios, no mês passado, cresceu quase sete vezes mais do que a média para julho .
De acordo com o decreto publicado hoje, a Secretaria da Amazônia e Serviços Ambientais ficará encarregada de formular e coordenar estratégias para a “prevenção e controle do desmatamento ilegal, dos incêndios florestais e das queimadas”.
Pesquisador do Instituto de Estudos Avançados da USP, Carlos Nobre avlaa que o governo tenta "reconhecer o erro" cometido ao mudar a estrutura do MMA logo após a posse do presidente Jair Bolsonaro.
— Foi necessário um ano e oito meses até o governo voltar a usar o termo "mudanças climáticas", que parecia ter sido proibido quando sua secretaria foi extinta.
Nobre pondera que é preciso esperar a posse dos novos secretários para avaliar se a reestruturação do MMA foi apenas uma "propaganda".
— Mas vale dizer que o governo não tem nenhuma pessoa em cargo de chefia, seja no MMA ou no Itamaraty, que seja respeitado na área de mudanças climáticas para assumir uma secretaria que lidará com o assunto. Alguns embaixadores têm experiência sobre o tema, mas estão silenciosos — pondera. — Outra pergunta em aberto é o que ocorrerá com o Conselho da Amazônia , comandando pelo vice-presidente Hamilton Mourão, após a criação da Secretaria da Amazônia. Mourão assumiu o debate relacionado à floresta porque o MMA havia perdido credibilidade. E agora, como fica?
Nobre também manifesta preocupação com a criação da estrutura subordinada diretamente ao ministério, e avalia que o ICMBio já vinha perdendo eficiência desde a militarização de seu comando por pessoas que não têm experiência na gestão de unidades de conservação. A presença de um departamento voltado a concessões, diz ele, é justificada pela "visão comercial" que Salles manifesta desde o início do governo de que o meio ambiente "não é patrimônio de todos os brasileiros", apenas daqueles que pagam pela tarefa de protegê-lo.
Secretário-executivo do Observatório do Clima, Marcio Astrini considera que a reforma administrativa do MMA é um "decreto cheio de vazios", já que a pasta não anunciou quais serão seus projetos prioritários. Astrini também se preocupa com o futuro do ICMBio.
Astrini considera que a recriação de uma secretaria destinada a assuntos climáticos, uma estrutura que foi abolida no início do governo Bolsonaro, não é necessariamente uma iniciativa positiva:
— Provavelmente é uma reação a pressão internacional contra o aumento do desmatamento. Mas o decreto, escrito no papel, não tem qualquer validade sem ações práticas, e o MMA não anunciou as estratégias ou objetivos que nortearam a criação das novas secretarias. Seu projeto continua sendo antiambiental. Mais uma medida para deixar a boiada passar.
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