Ecogênese e Paisagismo contemporâneo
- majutavares
- 11 de mai. de 2021
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A preocupação com o meio ambiente é uma pauta recorrente na sociedade contemporânea, que parece cada vez mais se atentar para as questões ambientais que dominam o cotidiano, seja através do noticiário ou das redes sociais. Essa melhora no índice de conscientização ambiental pode estar relacionada, também, às políticas de Educação Ambiental que emergiram em grande escala desde o final do século passado [1].
No Brasil, em pesquisa realizada no ano de 2018 pelo IBOPE – Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística, a pedido da WWF – World Wide Fund for Nature, foi constatado que nove entre dez cidadãos brasileiros, ao contrário do que se imagina, acreditam que o meio ambiente não está sendo preservado de forma correta. Este número, que representa 91% da população, foi maior quando comparado com a mesma pesquisa efetuada no ano de 2014 [2].
Diante a essa tendência, o paisagismo contemporâneo apresenta predisposição em harmonizar com os aspectos ambientais. Cabe ressaltar que esse direcionamento tem influência, além da preocupação da população, de uma legislação cada vez mais rigorosa nesse quesito. Dentro deste contexto, destaca-se a ecogênese, a qual é caracterizada pela reconstituição de ecossistemas perturbados através da reinterpretação desse ambiente pelo replantio de espécies vegetais autóctones (vegetação típica de uma determinada região). De acordo com Fernando Chacel, um dos principais paisagistas brasileiros que utilizam esta metodologia, essa forma de paisagismo é uma maneira para se atingir a reintegração entre a natureza e a cidade, onde a urbanização aliada ao desenvolvimento econômico/tecnológico atua em concordância com a preservação dos recursos naturais [3].
Embora o termo da ecogênese ter sido construído em um passado não tão distante, através de uma parceria entre biólogos e botânicos do Museu Nacional do RJ na década de 1940, a primeira iniciativa foi observada na cidade do Rio de Janeiro ainda na segunda metade do século XIX. Nesta época, onde a economia era comandada, principalmente, pela agricultura cafeeira, inúmeras florestas foram devastadas, o que prejudicou os mananciais que forneciam as águas de abastecimento da cidade. Uma das medidas para a recuperação do meio ambiente foi o reflorestamento da Floresta da Tijuca, onde foram replantadas espécies vegetais autóctones de matas adjacentes. Um dos responsáveis por este procedimento foi o paisagista Auguste Marie François Glaziou (1914 – 1994), conhecido por ser pioneiro na prática de arborização de praças e parques do Rio de Janeiro com vegetação nativa. Outra figura importante e que é considerada um dos precursores da ecogênese foi Roberto Burle Marx (1914 – 1994). Burle Marx seguiu a filosofia de Glaziou e despontou como um grande paisagista de jardins tropicais fazendo uso da vegetação nativa [3].
Por estes e outros acontecimentos, o termo ecogênese é considerado um neologismo, isto é, um novo nome para uma ideia já praticada outrora. O grande responsável pela criação do termo foi Luiz Emygdio de Mello Filho (1913 – 2002), no entanto, esse termo vem sendo fortemente associado ao nome de Fernando Chacel, pois é ele quem utiliza a palavra em seu discurso projetual. Chacel reforça que a prática da ecogênese é interdisciplinar e envolve profissionais de diferentes esferas do conhecimento, como botânica, biologia, zoologia, geografia, arquitetura, entre outros, tendo como objetivo principal atingir o desenvolvimento sustentável através do paisagismo.
De acordo com o paisagista, o principal exemplo da ecogênese poderia ser observado no Parque do Barreiro de Araxá, em Minas Gerais, local este que iria receber projetos do botânico Henrique Lahmeyer de Mello Barreto (1892 – 1962) em conjunto com Burle Marx. Este famoso projeto, desenvolvido entre os anos de 1942 e 1945, tinha como objetivo criar uma espécie de mostruário da paisagem brasileira, e isso seria feito a partir da introdução de espécies e associações de diversos biomas característicos, entre eles o Cerrado, a Caatinga e a Amazônia. Todavia, este parque se tornou economicamente inviável, pois a área fazia parte de um gigantesco complexo hoteleiro, o qual era financiado pela verba dos cassinos, ainda ativos entre os anos de realização do projeto [3].
Burle Marx sempre enfatizou que o verdadeiro progresso deveria ser em prol da garantia do bem-estar social, entretanto, tem-se observado uma diminuição gradativa dos padrões de conforto da população. Fato este que, principalmente, está relacionado à perda da qualidade ambiental nas grandes metrópoles e, muitas vezes, em cidades menores [3]. Atualmente, há uma preocupação de que o planejamento do espaço público realize uma conexão entre a preservação dos recursos naturais com o bem-estar social, criando oportunidades para se promover novas maneiras de relações sociais, com a inclusão de minorias e mudança de mentalidades que eram nocivas tanto para o meio ambiente, quanto para populações historicamente injustiçadas [4]. Neste sentido, salienta-se a importância de paisagistas como Fernando Chacel, que sempre trabalhou em benefício da qualidade ambiental urbana, atuando com o objetivo de atenuar as práticas agressivas e não sustentáveis em relação ao meio ambiente [3].

Fonte: Ibope/WWF [2]

Fonte: Ibope/WWF [2]
Referências Bibliográficas
[1] KARIMZADEGAN, H.; MEIBOUDIA, H. Exploration of environmental literacy in science education curriculum in primary schools in Iran. Procedia-Social and Behavioral Sciences, v. 46, p. 404-409, 2012.
[2] REDAÇÃO GALILEU. Pesquisa do Ibope avalia a preocupação da população com o meio ambiente. 2018. Disponível em <https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/Meio-Ambiente/noticia/2018/09/pesquisa-do-ibope-avalia-preocupacao-da-populacao-com-o-meio-ambiente.html> Acesso em: 11 de maio de 2021.
[3] CURADO, M. M. de C. Paisagismo contemporâneo no brasil: Fernando Chacel e o conceito de ecogênese. Rio de Janeiro: UFRJ/FAU, 2007.
[4] SCALISE, W. Parques Urbanos – Evolução, Projeto, Funções e Usos. Revista Assentamentos Humanos, Marília, v.4, n°1, p.17-24, 2002. Disponível em: <http://www.unimar.br/fea/assent_humano4/parques.htm> Acesso em: 11 de maio de 2021.
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