Após 5 anos do desastre em Mariana, ainda se encontra rejeitos da Samarco
- majutavares
- 30 de nov. de 2020
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Mais de cinco anos se passaram desde o rompimento da barragem do Fundão, pertencente à Samarco Mineração, no município mineiro de Mariana, porém os cerca de 10 milhões de metros cúbicos rejeitos de minérios, liberados pelo acidente, ainda jazem no fundo do reservatório da usina Hidrelétrica Risoleta Neves, mais conhecida como Candonga.
Localizada no rio Doce, na divisa entre os municípios de Rio Doce e Santa Cruz do Escalvado, em Minas Gerais, ela está inoperante desde então. E sem previsão para voltar a funcionar.
A jornalista e escritora Cristina Serra, autora do livro “Tragédia em Mariana: A história do maior desastre ambiental do Brasil”, lembra que a maior parte da lama da barragem do Fundão foi parar no rio Doce e por ele desceu até o lago de Candonga, 110 quilômetros abaixo do local do acidente. “Estimo que cerca 70% dos rejeitos que caíram no rio foram contidos pela barragem da usina”, conta.
De acordo com ela, a lama assoreou completamente o lago da hidrelétrica. “Na época, havia também muito receio do rompimento dessa barragem da usina, o que não ocorreu”, diz. “Ela segurou uma quantidade absurda de lama e de material sólido – porque ele levou junto tudo que encontrava pelo caminho, casas, equipamentos, veículos, carros, ônibus e até corpos de vítimas. E essa lama está lá até hoje”.
Esses rejeitos causaram impactos ambientais (fauna e flora), econômicos e sociais para os municípios e comunidades locais. “As consequências para fauna foram, principalmente, para os peixes, que tiveram grande mortandade”, diz Rodrigo Ribas, superintendente de Projetos Prioritários da Secretaria Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), de Minas Gerais “Além disso, com a paralisação da UHE foi também interrompido o sistema de transposição deles [subida para o lado de cima da barragem, para desova]”.
Quanto à flora, diz ele, o impacto da passagem da lama, da abertura repentina das comportas e das obras emergenciais, foi a desestabilização das margens, o que resultou no desabamento de taludes e, com isso, a destruição de vegetação e intervenção em Áreas de Preservação Permanente (APP). “Já para a comunidade houve significativa alteração no modo de vida”, acrescenta. “Afinal, comunidades que viviam de pesca e faiscação [extração de ouro e metais preciosos no rio] não puderam mais desenvolver suas atividades”.
Além disso, houve redução na geração de impostos com a paralisação da operação da hidrelétrica. “Existe um auxílio emergencial no âmbito do Comitê Interfederativo (CIF) para a comunidade atingida, mas a Semad não participa destas tratativas”, diz Ribas. “Também há o impacto das obras emergenciais e de recuperação, que já ocorrem há cinco anos”.
Segundo Antônio Faria Fortini, coordenador Geral do Projeto de Assessoria Técnica Independente Centro Alternativo de Formação Rosa Fortini, uma organização não governamental que presta apoio jurídico e social aos atingidos pelo rompimento da barragem do Fundão, são vários os impactos socioeconômicos causados pelo desastre. “Ele inviabilizou, de forma definitiva, ofícios, práticas de trabalhos realizadas ao longo de gerações e relações imateriais de pertencimento, tais como a faiscação, do uso do rio como espaço de lazer e recreação gratuito, notadamente para ações de turismo e esportes náuticos, dentre outras perdas imateriais’, explica. “Além da paralisação completa da geração de energia na usina, causando desemprego dos seus funcionários e também da geração de recursos desta atividade para os municípios de Rio Doce e Santa Cruz do Escalvado”.
No caso dos impactos ambientais, apesar deles serem perceptíveis, ainda não se sabe a sua dimensão exata. “As características físicas, químicas e biológicas do rejeito que está depositado no reservatório e na calha do rio e no lago ainda são desconhecidas”, explica Fortini. “Não há estudos conclusivos dos impactos na fauna e flora aquática, bem como do contato com a água para a população ou mesmo os efeitos se utilizada para irrigação de cultivos agrícolas ou para os animais. Isso é motivo de constante preocupação da comunidade atingida, quanto aos malefícios à saúde e ao meio ambiente que este sedimento pode ocasionar”.
Além da incerteza científica sobre o uso e a qualidade da água e do pescado para consumo humano, prática tradicional no Rio Doce e no Lago de Candonga, e do risco e das limitações ao fornecimento de água aos animais de criação e irrigação de cultivos agrícolas, Fortini comenta que há também relatos de aumento de desequilíbrio ambiental nas comunidades e propriedades da calha do rio e lago, como o aparecimento significativo de mosquitos. “Isso tem causado aumento de doenças transmitidas, como febre amarela e dengue, surto de febre maculosa [doença do carrapato], aparecimento de peixes com alteração morfológicas”, diz. “Além da alteração em si de toda dinâmica do rio e do reservatório pelo assoreamento causado pelo rejeito”.
De acordo com Fortini, perdura a mesma inatividade do reservatório e da usina até o momento. “O lago foi rebaixado ao nível do rio com as comportas abertas”, explica. “Ao longo dos cinco anos foram construídas estruturas de barramentos metálicos na água para retenção e redução da mobilidade do rejeito, além de obras de manutenção e reforço da estrutura do reservatório, encostas e da manutenção e equipamentos da usina. Atualmente encontra-se em curso no órgão ambiental do Estado a análise do processo de licenciamento – LOC [Licença de Operação Corretiva], referente ao conjunto de ações e obras já executadas e que ainda serão realizadas para execução dos cenários de remoção dos rejeitos, visando a retomada das atividades da UHE”.
Independentemente disso, Fortini diz que a pergunta que as comunidades atingidas fazem diariamente é por que em cinco anos o problema ainda não foi resolvido.
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